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quarta-feira, 10 de março de 2010

o professor que estudou a tragetoria social dos skatistas brasileiros!!!

Billy, você é um grande pesquisador do skate. Como é o seu dia a dia e qual é o seu envolvimento com o skate?

Em primeiro lugar é importante lembrar que o Skate como objeto de pesquisas é algo novo, são poucas as pesquisas realizadas no contexto da academia brasileira (universidades, faculdades, institutos de pesquisa).

Imagino que dos trabalhos que têm a ver com skate, apenas 10 % estejam preocupados com o próprio, os demais o tangenciam como uma questão secundária. Então, não há ainda grandes pesquisadores do skate no Brasil.
Entretanto, não podemos deixar de citar que há bons trabalhos, sobretudo, acerca da história do skate, assim como outros com abordagem ancorada nas ciências sociais. A grande contribuição desses trabalhos, em minha opinião, foi de trazer para os debates o skate como estilo de vida, não como uma moda ou um esporte. Eu estou envolvido com o skate e com skatistas há muitos anos, então posso dizer que há algo no skate que tem a ver só com ele, que escapa às tentativas de explicá-lo por caminhos já conhecidos. Eu parei de andar há anos, mas convivo bastante com skatistas, alguns dos meus melhores amigos são gente de skate (skatistas, lojistas, etc).
Hoje estou me preparando para fazer uma proposta de disciplina à minha universidade, para o ensino do skate no curso de Educação Física. Eu sou professor de uma universidade e divido minhas atividades entre lecionar disciplinas no Curso de Educação Física, realizar e orientar pesquisas e fazer atividades de extensão universitária.
Trabalho por um mundo justo e igualitário, num horizonte para além do capitalismo.

Você é formado em educação física e fez um mestrado com o trabalho “Estilo de vida e trajetórias sociais de skatistas: da vizinhança ao corre". Conte um pouco sobre este desafio de fazer o mestrado.

Antes de qualquer coisa, devo fazer referência ao apoio que tive por parte do meu orientador, Prof. Dr. Marco Paulo Stigger (UFRGS), que mesmo sem conhecer muito do assunto, teve a coragem de orientar o trabalho e o fez muito bem. Por outro lado, eu também não sabia muito bem por onde começar. Havia tanto assunto a se tratar que me perdi um pouco no universo do skate durante um tempo. Fiz uma pesquisa histórica sobre o skate no Rio Grande do Sul, que entre outras coisas virou um capítulo do Atlas do Esporte no RS e um capítulo da dissertação. Passei a andar com skatistas vários dias na semana, por várias horas. Era a tal da etnografia.
Essa foi a parte legal, estar com os caras. Realizei dezoito entrevistas com quatorze skatistas do universo dos patrocínios, um empresário e um dirigente. Fiquei mergulhado no universo social do skate mais de dois anos.
Fui a sessions, campeonatos, reuniões, visitas, demos, passear, resolver tretas, entre outras coisas. Daí veio a parte difícil, deixar o campo e escrever. Foi barra ler tudo que aparecia sobre os assuntos que levantara nos diários de campo (registros do tempo que passava com os caras). Mas valeu a pena. Penso em fazer o doutorado nesse esquema, mas com um tempero diferente, que não vou contar para não estragar a surpresa


O que você mais gostou de fazer durante a pesquisa?

Então, o legal foi poder estar com skatistas (amigos, a maioria deles), ouvi-los nas entrevistas e tal. Foi difícil em alguns momentos, às vezes os caras não tinham tempo. Entrevistei o Marcus Cida num restaurante barulhento na Cidade Baixa em Porto Alegre, depois não dava para ouvir direito a gravação. Pega um cara como aquele figura do Gnomo, daí ele não pára mais de falar... foi massa. Entrevistei o César Gordo três vezes, uma delas no aeroporto, ele contribuiu um monte com a pesquisa.

Conversar com caras que estão no skate há um tempão como o Chita, Poupa, Russo. Conversar com quem tá chegando, Luan, Ique e outros, levá-los tão a sério como os outros e ver a cara deles de espantados, pensando mil anos em cada resposta. Foi legal ver que vale a pena levar o skate a sério.


O que você gostaria de destacar sobre este trabalho? Dois elementos se destacaram nesse trabalho.
O primeiro diz respeito à própria trajetória da maioria dos skatistas que estão no mundo dos patrocínios, das peculiaridades que lhe são comuns, de uma série de acontecimentos mais ou menos organizados que compõem a história de suas vidas e que os levaram até ali e dizem de sua condição no mundo.
Então, essa trajetória, que eu descrevo em pormenores no trabalho, considero um achado acadêmico e científico, porque houve momentos em que desconfiei que não conseguiria descobrir o que os diferenciava. O segundo elemento ainda está sendo trabalhado por mim, foi uma herança desse trabalho.
Diz respeito ao skate na gama de práticas corporais existentes, de suas particularidades. Já apontei para isso no final da dissertação, entretanto não pude ainda desenvolver o tema. Como pode um skatista ter patrocínio e mais sucesso que outros sem ter ganho ou ido bem em competições? Esta é a questão que pretendo apresentar em um livro que vários estudiosos estão escrevendo e que deve ser lançado ainda esse ano.


Você estudou as trajetórias sociais dos skatistas profissionais, desde suas atividades iniciais nos ambientes de vizinhança.
Quais os aspectos positivos e negativos podem ter para os novos skatistas que estão se iniciando em ambientes de colégios e clubes?

Não vejo nenhum mal, o skate é totalmente anárquico, mesmo que um menino comece na escola ou no clube, o skate vai ganhar vida debaixo de seus pés e ele vai viver mesmo o skate é na rua. Não existe skate sem rua. É como colocar em dúvida o ensino de futebol

Você poderia destacar as principais características no estilo de vida de um skatista profissional?
Esse é o trecho de uma entrevista que fiz com um skatista de nível internacional: ...eu tenho dito que a vida de um profissional tem um tripé: 1. Participar de competições; (o skatista concorda com a cabeça durante toda minha descrição) 2. Filmar e tirar fotos para revistas e vídeo magazines; 3. Viajar para fazer demonstrações para as marcas que patrocinam o skatista. Esse seria o tripé da vida do skatista? R: Isso.
Mas sempre junto da demo (demonstração) tem a sessão de autógrafos. É um lance meio de praxe. Agora eu tô há um mês e meio, agora, todo fim-de-semana viajando o Brasil inteiro, fazendo demos...

Responde bastante coisa, né? Eu acho que sim, mas que também não. Porque vai bem além disso. Como disse outro skatista, o profissional ou patrocinado vive no play (não no fast forward), pelo skate, na session, no pico com a galera, mas sem perder as oportunidades que aparecem e sem deixar de cavar as oportunidades também. Mas muita atenção: pisou na cabeça de alguém para subir, abra o olho, vai se queimar com a galera, daí já viu.a velha feia ou a virgem linda? Agora imagine que "esportistas" praticantes de um esporte parecido com o basquete eram sacrificados em sua comunidade indígena 500 anos atrás na América Central.
Quem era sacrificado (morto), os vencedores ou os perdedores? Se tivéssemos que imaginar alguém sendo levado à morte hoje, como destino de um jogo, seriam perdedores ou vencedores? Antes de um skatista poder correr um champ numa olimpíada, nossa sociedade ainda vai ter que andar muito... ou o skate perder algumas de suas qualidades mais preciosas... agora, eu acompanhei uma discussão sobre esse assunto num Fórum Social Mundial em Porto Alegre. O antigo presidente da Confederação Brasileira de Skate disse que a Olimpíada teria que se adaptar ao skate e não o contrário... daí já acho que é ingenuidade...


Muitas vezes, uma idéia puxa outra. Você teria sugestões de outras pesquisas sobre o skate que poderiam ser realizadas?

Muitas!!!! Cada skatista que vai estudar (como eu fiz) poderia se perguntar como poderia dar visibilidade ao skate dentro de sua área. Acho que a questão dos materiais tem que evoluir na cena brasileira, temos que ter materiais bons em nossa indústria (isso melhorou bastante desde meus tempos de skatista). Acho também que o ensino do skate tem que se desenvolver, que precisamos discutir assuntos relativos à gênero no ambiente do skate (há muita homofobia ainda e o papel das mulheres tem que ser debatido) e que precisamos de uma forma mais elaborada para combater o aspecto fortemente comercial da prática. Esses são alguns desafios aos skatistas-pesquisadores.




Obrigado cienciadoskate.com.br

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